Bullying no escritório

Quem tem paciência para ser tolerante com o bullying no ambiente de trabalho? Eu certamente não. Como se não bastassem os compromissos e as dificuldades do trabalho em si, você acaba tendo de lidar também com a intimidação do colega valentão, o manipulador, os formadores de quadrilhas (que pensam estar fazendo networking), e tantos outros personagens e estereótipos que encontramos como obstáculo a um trabalho bem feito e a uma equipe coesa.

Mas, gostando ou não, se você está em uma organização em que isto ocorre, terá que encarar as 3 opções apresentadas no agora já quase vintage filme Tropa de Elite I: ou se corrompe, ou se omite, ou vai pra guerra.

Se omitir em geral é fácil - é só ir abrindo mão aos poucos das coisas até não ter mais nada que os valentões desejem, e aí ser visto como ultrapassado e ficar no ponto pra ir pra rua na próxima reestruturação.

Se corromper neste contexto não é tão comum, mas ir para a guerra é - e nesta situação significa encarar de frente a política da intimidação, mesmo que não seja com as mesmas armas e nem na forma de um contra-ataque.

Identificando o bully

Normalmente não é difícil identificar um valentão mas, se você estiver precisando de uma confirmação, aqui estão alguns comportamentos comuns para colocar na sua checklist.

O típico valentão do escritório, inseguro e controlador, pratica pelo menos 4 dos comportamentos abaixo:

  • Remove arbitrariamente opções, de modo a deixar abertas só as alternativas que lhe convêm pessoalmente
  • Coloca a equipe contra a parede e sob pressão desnecessária
  • Tenta sabotar a possibilidade de discussão objetiva quando as suas preferências estão em jogo
  • Manobra nos bastidores para transferir suas culpas para os colegas e ficar com os créditos pelas vitórias deles
  • Eleva o tom de voz quando seu argumento não é o vencedor
  • Usa subterfúgios para fazer com que propostas que não lhe sejam convenientes nem cheguem a ser conhecidas por quem deveria analisá-las
  • Descarta (ou tenta desvalorizar) dados e fatos que não condizem com sua própria visão
  • Se esforça para evitar que o "outro lado da história" possa ser apresentado
  • Mascara o seu comportamento com eufemismos: "sou autêntico", "falo pela frente", "sou competitivo", "promovo o debate", etc.

Como se vê, não é requisito que o valentão do escritório seja grosseiro, se vista mal, critique inapropriadamente a aparência e o comportamento alheio, fale palavrão e pratique formas evidentes de assédio moral: na política corporativa é perfeitamente possível praticar a violência com luvas de seda.

Lidando com o valentão

Não é fácil se livrar deles. Assim como as baratas, os valentões existem desde os primórdios, e desenvolveram técnicas de adaptação que praticamente garantem que sobreviverão até mesmo a um holocausto nuclear - eles só não se adaptam a pessoas preparadas para não ter medo de discurso nem de cara feia.

Qualquer estudioso de táticas de combate poderá lhe confirmar que, do ponto de vista de uma estratégia primária de manutenção da integridade de quem é um alvo de perseguição, a evasão (ou seja, não ser percebido como alvo) é muito mais vantajosa do que o confronto ou a fuga.

Assim, se o que você quer é apenas cuidar da sua vida, procure evitar ser um alvo preferencial, pois os valentões geralmente escolhem alguns alvos repetitivos e os usam como vítimas para exibir seu poder aos demais da "manada".

Se você já for um alvo, e não puder agir direto na causa (por exemplo, remover o bully ou você mesmo ir para um ambiente mais saudável), aí o ideal passa a ser resistir ativamente.

Lembre-se sempre que tentativas de intimidação verbal são muito comuns, dentro e fora do escritório, mas a eficácia delas é limitada pela capacidade de as pessoas reagirem.

Se você se encolhe, certamente será intimidado de novo. Mas se mantiver a calma, pagar para ver, e sustentar sua posição, é bastante provável que acabe descobrindo que o intimidador não tinha nenhuma outra arma além da voz alta e da atitude ameaçadora - e aí será mais fácil resistir na próxima vez, até deixar de ser um alvo preferencial.

Durante o assédio

Assédio moral é questão séria, e se você for uma vítima, a recomendação é buscar orientação jurídica ou na sua entidade classista, pois pode haver muitos cursos de ação que sejam do seu interesse tanto na prevenção quanto na reparação.

Vale lembrar que, durante a intimidação verbal, a meta do valentão é fazer sua vítima perder o controle, para melhor poder ser manipulada. Se a vítima chorar, gaguejar, erguer a voz, tanto melhor - ele saberá como lidar com a situação e explorá-la. Portanto, se você retiver sua consciência, lembre-se que a SUA meta é manter o controle emocional e físico - se possível, encarando de frente o valentão e demonstrando que não se comove com o show dele. Revidar geralmente não é uma opção, ao contrário do que acontece no pátio da escola.

Mas na ausência desta providência, aqui estão algumas sugestões sobre como agir durante os ataques infundados do valentão:

  • Não perca a calma nem a postura: o assédio do valentão é uma situação que ele conhece bem, sabe controlar e tem como meta mostrar a você e aos outros que ele controla você. É uma armadilha, uma teia de agressões (expostas ou veladas) construída para fazer você perder o seu controle, se expor, e com isso fazer com que o valentão seja visto como o dono da situação.
    Assim, se você tentar falar e for interrompido, não tente de novo - avise (de forma que outras testemunhas lhe ouçam) que nessas condições não há diálogo, e aí ignore-o, ou comece a fazer outra coisa, mas deixe claro que gritos e grunhidos não servem como comunicação com você. Essas são respostas pelas quais ele não espera e, ainda que ele cante vitória pela sua "fuga", são percebidas pelos demais como um ato de superioridade de quem não precisa participar deste tipo de abuso.
     

  • Saiba o que falar no momento certo: já vimos que um dos comportamentos do valentão é evitar que o "outro lado" possa contar sua versão. Ainda que você tenha um discurso a fazer que o demoliria, ele não vai deixar você falar mais do que a primeira frase.
    Portanto, aproveite bem esta única frase, encare-o de frente e use-a de forma que o público do valentão também ouça, bem no momento em que ele estiver atraindo a atenção de todos. Uma que já usei com sucesso, com um "orientador motivacional" que perdeu seu foco, foi "Pode continuar falando! Não vou fazer, e quero ver quem me obriga" - aí prolongar o discurso só aumentava a derrota dele.

    Em outra ocasião, quando usei uma frase mais longa ("Se estou em falta, denuncie - estou em dia, tranquilo e ocupado, e esse teu discurso todo não convence nem comove"), só cheguei até a palavra "discurso" antes de ele começar a vociferar de novo pra plateia, mas aí eu já estava olhando pra uma planilha e o público perdeu o interesse.
     

  • Bloqueie o acelerador: se o valentão tiver autoridade - por exemplo, se for em uma reunião de investigação ou auditoria e estiver pressionando para fazer você responder só o que ele deseja que seja dito - e você for obrigado a responder a ele, cuidado com a tática do acelerador: ele faz uma pergunta, você começa a responder e, no momento em que já disse o que ele queria ouvir, ou quando começa a falar o que ele não quer ouvir, ele o interrompe com a próxima pergunta, não se deixe intimidar.
    O que você precisa responder é "responderei a esta nova pergunta também, mas depois de terminar a resposta anterior". A reação natural dele será dizer "Já está respondida e avancei para a próxima". Responda "Avançaremos sim, mas só quando eu terminar a anterior" tantas vezes quantas forem necessárias, a não ser que alguém presente tenha real autoridade para fazê-lo parar.

    Mas controle a emoção. Nada de elevar a voz ou demonstrar desrespeito. Ele vai continuar querendo cortar e acelerar, e pode usar o seu desrespeito para justificar o fim antecipado da sessão.
     

  • Documente: Na ausência de testemunhas confiáveis, o que se pode fazer é documentar (quanto mais cedo melhor) na forma de um relato assinado e datado que descreve o ocorrido, inclui a lista de evidências (se houver) e pede providências de prevenção de repetições, encaminhá-lo formalmente à autoridade responsável (seja a área de gestão de pessoas, o chefe da equipe, o seu chefe, ou o que for) e pegar o comprovante de recebimento aplicável à sua organização. Se a sua empresa for daquelas em que impera uma lei do silêncio ("bom cabrito não berra" e similares), isso pode lhe trazer problemas adicionais, portanto aja conscientemente e já com orientação jurídica neste ponto.

Não seja você também um brigão

Quem é vítima da política do escritório em geral não o faz por opção, mas esta é a escolha que resta, além de brigar ou fugir.

Só que uma consequência imprevista (além das óbvias que se manifestam na produtividade e motivação) é que ao resistir ao bullying, você pode acabar sendo visto como o "criador de caso" e brigão - exatamente como acontece no pátio das escolas há séculos - porque o bully tem simultaneamente a iniciativa e a experiência em parecer a vítima, e você é um mero amador.

Portanto, lembrando o exposto, se você não quer participar, o melhor é evitar se colocar na posição de alvo: não correr para tomar partido em discussões que não o envolvam (se o envolverem, aí ter uma posição passa a ser necessário, claro), manter o foco nos objetivos (os seus e os da organização), e cuidar para não misturar o que é pessoal e o que é profissional, mesmo que os outros estejam misturando.

Isso não significa que você precisa engolir desaforos (releia os parágrafos acima), mas sim que não precisa deixar os outros imporem a sua forma perniciosa de fazer política demarcando território!

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