Pergunta aos leitores: excesso de planejamento financeiro familiar pode ser um obstáculo?
A leitora Carina Cheng enviou uma série de questões abertas que merecem um artigo mas, por sua natureza, achei melhor (com autorização dela, naturalmente) publicar a mensagem que ela enviou, acompanhada da minha resposta expressando um ponto de vista pessoal, e aí abrir a discussão entre todos vocês, leitores interessados.
A mim parece que a questão central está relacionada a um delicado ponto de equilíbrio entre o desejo de garantir a estabilidade familiar a longo prazo e o perigo de transformar a vida de toda a família em um registro contábil. Mas certamente a questão tem nuances mais delicados, por isso apresento a vocês a sequência completa, para posteriormente colher suas opiniões e contribuições nos comentários.
Começou com o e-mail abaixo, enviado pela Carina:
Hoje, numa conversa sobre planejamento financeiro para o futuro, surgiu uma questão que não lembro de ter lido no seu blog, embora seja bastante relacionado ao tema, que é recorrente.
Em muitos lugares lemos sobre o planejamento pessoal quanto a objetivos pessoais e profissionais, a organização de metas e tarefas, wishlists, mas sempre relacionados a nós mesmos e a nossos projetos e desejos. Entretanto, na conversa, chegamos num ponto em que paramos e pensamos sobre o quanto nosso planejamento (no caso em específico o financeiro, mas com certeza outros também) pode afetar não apenas a nós mesmos, mas às pessoas mais íntimas, como pais, filhos e companheiros.
Por exemplo: ao morar já há alguns anos fora da casa dos pais, formada e com emprego relativamente estável, eu poderia (talvez deveria) começar a pensar em direcionar parte do meu orçamento para ajudar meus pais, prestes a se aposentarem, mantendo um padrão de vida. Outro exemplo: começar a fazer o planejamento em conjunto com o respectivo cônjuge para poder pôr em prática planos como comprar um apartamento e ter filhos.
O quanto isso tiraria de nós o poder sobre nossos desejos? Ou, quanto isso teria peso sobre nossos planos? Seria apenas mais uma célula de nossas planilhas? Será que pode existir um lado emocional na racionalidade toda da organização pessoal?
Com certeza a extensão desse assunto é enorme, e as ramificações infinitas, mas gostaria de perguntar seu pensamento a respeito. E talvez, lançar a idéia aos leitores e ver diferentes pontos de vista quanto a isso, pois devem ser muito diversos e construtivos! :)
Eu respondi a ela, confirmando que acredito nas suposições que ela lançou. Sou fã do planejamento estratégico pessoal, mas quando ele dá um passo além e vira planejamento operacional e financeiro familiar a longo prazo, um sinal de alerta se acende, devido aos riscos que a própria natureza informal da dinâmica familiar impõem.
Segue o trecho relevante da minha resposta, ligeiramente editado para inserir os links:
Acredito que, se houver o interesse em gerenciar objetivamente as metas em paralelo mencionadas como exemplo (construir fundo sustentável para apoio financeiro aos pais após a aposentadoria deles, comprar apartamento, colocar-se nas condições desejadas para ter filhos, etc.), as disciplinas do Planejamento Estratégico e do Gerenciamento de Projetos podem ajudar bastante.
Mas pessoalmente tenho dúvidas sobre se vale a pena gerenciar a própria vida (e a dos que lhe cercam) como se fosse um empreendimento, pois há o risco de que o sucesso passe a ser medido pela capacidade de produzir receita e/ou poupança - e quando isso acontece, eu acredito que há grande perda da qualidade e do aproveitamento, sem contar que tende a conduzir a uma abordagem excessivamente conservadora da vida como um todo.
Ao mesmo tempo, quando se reduz estes processos (a estabilidade dos familiares após a aposentadoria, a segurança dos filhos, etc.) aos termos objetivos requeridos em um projeto, temo que as próprias escolhas de vida das pessoas que se deseja proteger passem a ser gerenciadas e medidas em termos reduzidos a débitos e créditos, oportunidades e ameaças. Não é uma perspectiva saudável, na minha opinião - e pode levar a uma versão ampliada do dilema que já descrevi no artigo "Você usa bem o tempo que o seu ganho de produtividade libera?".
Talvez seja possível chegar a um meio termo, com um fundo de reserva familiar convencional (como descrito em "Crie o seu Fundo de Reserva pessoal, e encare a vida com mais opções"), e apenas um planejamento das metas ou expectativas gerais.
Se possível, com participação ativa das pessoas que se deseja proteger, sem transformar a vida de ninguém em empreendimento, e sem que nenhuma das partes precise se comprometer a deixar de correr os riscos associados aos desafios que o crescimento pessoal nos apresenta!
A nova resposta dela acrescentou mais uma idéia-chave:
Começaram a se formar na minha mente algumas novas idéias sobre o tema ao ler sua resposta; transformar todo o planejamento familiar num empreendimento, numa relação de patrão e funcionários, poderia restringir excessivamente a liberdade pessoal de cada um. Como agir quando o relacionamento pessoal e os sentimentos podem interferir tanto nas nossas ações e decisões, que às vezes precisam ser tão racionais?
E neste ponto, ambos concluímos que seria interessante levar esta questão ao conjunto de leitores, para que possam compartilhar suas experiências e opiniões a respeito.
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