Home office: vale a pena

Home office vale a pena - posso testemunhar, pois adotei este tipo de organização do trabalho desde 2005 e cada vez me surpreendo mais com as novas possibilidades que vão surgindo de ter produtividade a sério trabalhando a partir de casa.

Não costumo falar extensivamente por aqui sobre minhas próprias experiências pessoais, afinal o Efetividade não é um blog naquele estilo "querido diário, hoje almocei frango com salada" - pelo contrário, aqui normalmente as minhas experiências pessoais ficam apenas como pano de fundo para as técnicas e situações que desejo abordar.

Mas a Camila Borges, aluna de Administração da Universidade Federal aqui de Florianópolis, exercitou seu networking para chegar a mim e, na minha impossibilidade de ir à faculdade dela na data em que haverá a aula sobre isso, me pediu que gravasse um depoimento em vídeo sobre minha experiência em home office, para apresentação em aula sobre o tema.

Como graduado em Administração, claro que simpatizei com o interesse dela em trazer para a sala de aula do curso uma experiência prática sobre a matéria que está em estudo, e que muito me interessa.

Mas não deu de gravar o vídeo, então resolvi preparar a apresentação acima (também disponível em slides e PDF) para ela levar para a aula, e escrever este artigo-testemunho que ela também poderá levar à faculdade, e que poderá eventualmente ter informações interessantes para os demais leitores. E como a aula será no dia 27, estou adiantando a publicação do post, para que não perca o objeto!

Vantagens e desvantagens

Na minha experiência pessoal, as maiores vantagens de trabalhar em home office são ter mais controle sobre o fluxo e as fontes de interrupções no trabalho, e a possibilidade de dispor o espaço de trabalho da forma como melhor se adaptar à minha produtividade pessoal, sem as restrições que ocorrem no ambiente corporativo.

Mas também incluo na minha lista pessoal:

  • a independência de horários,
  • a economia de tempo e custo de transporte,
  • a redução do investimento necessário na montagem do seu ambiente de trabalho, e
  • uma série de vantagens relacionadas à qualidade de vida.

Mas também pode haver obstáculos e desvantagens. Por exemplo (e felizmente não é meu caso), quando se trata de teletrabalho - ou seja, um funcionário cujo local de trabalho não é o escritório da empresa - um estudo recente publicado pela Network World mostra que hoje pode haver impacto no avanço da carreira, pois as melhores vagas tendem a ser dadas às pessoas que atuam presencialmente.

No caso dos profissionais liberais, independentes ou autônomos, isto pode não ser um problema, mas mesmo eles precisam lidar com as situações práticas, de separar o que é ambiente (e horário) de trabalho e o que é de convívio familiar, manter-se motivado para trabalhar mesmo sem o acompanhamento próximo de um chefe e colegas, e também o outro lado da moeda, que é saber a hora de parar e "encerrar o expediente".

Para completar, há o desafio de ser percebido como um profissional produtivo, sem o preconceito que pode ser despertado por uma pessoa que, essencialmente, fica o dia inteiro em casa.

O que eu faço no meu home office

No meu caso pessoal, a ideia de montar um escritório em casa surgiu da constatação de que eu já estava trabalhando em casa há um bom tempo, mas não havia me dado conta de que poderia ser bem mais eficiente se me organizasse para isso.

Não dá para contar isso sem um histórico, portanto explico: embora eu tenha e mantenha uma carreira no estilo "tradicional", com expediente diário e vínculo empregatício sólido (atuo como Administrador, na área de Planejamento Estratégico), desde 1996 tenho como atividade paralela a criação de conteúdo para a web - nesse ano criei e desde então mantenho o site BR-Linux, que os entusiastas de código aberto entre vocês provavelmente já visitaram.

Embora sempre tenha sido uma atividade que exerço por prazer, na virada do século este hobby acabou se tornando lucrativo, graças às receitas de publicidade e ao interesse de várias empresas de anunciar em veículos que se dirigissem ao público "tech" - incluindo meu blog ;-)

Claro que com isso a carga de trabalho aumentou, não apenas pelo interesse de escrever conteúdo em maior volume, mas também porque gerenciar uma atividade lucrativa dá trabalho: é preciso haver cadastro de clientes, contato com parceiros, controle de fluxo de caixa, os diversos documentos fiscais, etc.

Quando eu percebi, estava cada vez mais "atolado" nas minhas atividades relacionadas ao blog e, o que é pior, gastava bem mais tempo nas atividades de suporte do que nas operacionais - ou seja: o tempo que gastava procurando onde estava o telefone daquele cliente de publicidade que sumiu era um tempo que eu não podia dedicar ao meu "negócio", que era escrever e interagir com os leitores.


Minha mesa de trabalho em setembro de 2010

Eis que surgiu na minha vida o home office (e o interesse em produtividade pessoal) como solução, e em 2005 isso acabou virando o tema de mais um blog - o Efetividade, no qual falo justamente sobre os aspectos que me permitiram essa virada - e cuja aplicação me permitiu fazer com que sobre tempo, ao invés de faltar ;-)

E esse tempo de sobra, além de ser bem empregado na minha própria qualidade de vida, me permitiu um grande ganho de produtividade em relação à situação anterior, pois agora, além de manter minha atividade profissional anterior, de manter os 2 blogs já mencionados, e de continuar a realizar as atividades de apoio administrativo a tudo isso, eu ainda escrevo para uma revista impressa e 2 outros sites - nada mal para quem não conseguia tempo para manter um blog, hein?

E o mais interessante: desde 2008, comparando mês a mês os rendimentos líquidos, a minha atividade no home office frequentemente se equipara, ou mesmo supera, os proventos recebidos do meu emprego formal. Mas eu gosto de ambas as atividades, então não penso em largar uma para me dedicar exclusivamente à outra (inclusive porque elas se complementam positivamente, e não encontro dificuldade em separá-las).

Por que optei por um home office

Existem muitas razões possíveis para essa escolha, desde escapar do tempo perdido nos deslocamentos diários entre casa e escritório, até a impossibilidade de arcar imediatamente com o investimento para abrir um escritório fora de casa, passando por uma série de outras situações já suficientemente apresentadas e discutidas: fugir do patrão, passar mais tempo próximo à família, e tantas outras.


Meu home office em setembro de 2010

O meu caso não é típico: montei meu home office para desenvolver uma atividade extra, em paralelo (sem concorrência, claro) ao meu emprego formal. O ganho desejado, quando iniciei, estava entre o conceito da produtividade e o da eficiência, com várias pitadas de O&M: eu queria ter uma estrutura para reduzir o esforço das atividades produtivas e especialmente das atividades de apoio.

Para mim isso se traduziu, em 2005, em um cantinho da sala do apartamento convertido em escritório, com uma escrivaninha ampla, gaveteiro e um armário simples. Neles instalei o que até hoje se constitui no "quadrado mágico" dos meus escritórios subsequentes:

  • meios de produção: basicamente o computador e seus acessórios
  • comunicações: telefone com secretária eletrônica, exclusivo para as atividades profissionais
  • registros: um arquivo de pastas suspensas que equivale ao meu departamento de pessoal, contabilidade, financeiro e jurídico - só falta ele aprender a fazer análises e me dar as respostas prontas, porque as informações já estão todas lá ;-)
  • referências e material de apoio: minha atividade é escrever sobre assuntos tecnológicos, então tenho grande quantidade de livros, periódicos, equipamentos e outros recursos que me permitem o essencial: ter assuntos e transformá-los em material inédito e de qualidade.

Desde então muita coisa mudou, inclusive meu endereço - fiz 2 mudanças desde o primeiro home office que montei, e em cada uma delas aproveitei para melhorá-lo. Em 2007 ele ganhou um cômodo só para ele, e em 2009 foi remodelado para deixar os materiais de referência mais à mão.

A partir de 2009 também passei a morar longe do centro de Florianópolis, e aí as atividades no home office também passaram a significar grande economia de deslocamentos, e anseio pelo dia em que meu emprego formal também possa aderir aos benefícios do trabalho a partir de casa!

As armadilhas do home office

Quem trabalha na rotina usual dos deslocamentos diários e convivência difícil com equipe e chefia tende a imaginar que a rotina em home office é a solução completa que resolve todos estes problemas sem criar outros, mas não é verdade: trabalhar em home office (especialmente se esta for a sua única atividade profissional) também tem suas dificuldades, incluindo as que destaco:

  • Separar trabalho e vida pessoal: quando há motivação, quem trabalha em home office pode sofrer muito mais com a síndrome do trabalho excessivo, com horas extras absurdas, abrindo mão do convívio familiar, do lazer, trabalhando nos finais de semana e entrando pela noite todos os dias. É necessário se policiar para não ser um chefe tirano de si mesmo. O ideal é ter um horário definido (com flexibilidade) para a atividade profissional, procurar respeitá-lo, e comunicá-lo tanto aos parceiros de negócios quanto aos familiares.
     

  • Fazer com que os outros separem seu trabalho e sua vida pessoal: familiares e pessoas próximas podem ter dificuldade em entender que, embora você esteja em casa, você está trabalhando. Por mais que a presença deles seja bem-vinda, pode haver o momento em que ela se converte em um obstáculo ao seu foco - o desafio se renova sempre que o profissional do home office ouve dizer "ah, ele nem trabalha, só fica em casa o dia inteiro" ;-) Aqui em casa há bastante compreensão quanto a isso, mas nem todo mundo encontra as mesmas condições favoráveis.
     

  • Receber parceiros e clientes: fazer uma reunião com fornecedores ou clientes acaba se tornando uma prova de fogo - por mais profissional que você seja, nem todos os lares estão aptos a receber uma reunião de trabalho sem dar a impressão oposta. A solução padrão é realizar as reuniões e contatos fora do home office. No meu caso a maioria dos clientes e parceiros estão bem distantes geograficamente, então a solução acaba sendo o contato virtual, e funciona bem - mas é necessário ter os clientes certos para isso acontecer ;-)
     

  • Crianças: não é meu caso, mas a literatura está repleta de relatos sobre como é complicado trabalhar em home office quando há crianças na casa, pois naturalmente Elas querem estar presentes, querem contato e merecem nossa atenção – precisam ser levadas em conta, portanto – não só quanto ao impacto da sua presença sobre a produtividade, mas também quanto aos horários (da escola e demais atividades) e ao cuidado e atenção que elas precisam ter. convivência da família com o home office costuma ser um grande desafio.
     

  • Iscas: é difícil manter a produtividade quando estamos cercados de iscas que atraem outras pessoas da casa para o ambiente do home office. Se a melhor TV da casa, um sofá confortável, um videogame, o computador que funciona melhor, a impressora na qual não falta tinta, e o melhor suprimento de material de escritório da casa estiverem reunidos no home office, é natural que este ambiente seja visto pelos demais como uma central de entretimento misturada com um almoxarifado gratuito, lan house 24h e bureau de impressão - em outras palavras, vale a pena procurar quais são as iscas que atraem outras pessoas ao seu ambiente no horário de trabalho, e colocá-las em outros locais da casa! Afinal, Home office não é home entertainment center...

A configuração básica

Um princípio básico do projeto de ambientes funcionais é que a forma deve seguir a função. No caso dos ambientes de escritório (incluindo home offices), uma boa regra básica para procurar seguir é organizar como uma cabine de avião, com os itens mais usados e mais importantes sempre próximos ao seu campo de visão, espalhando os demais radialmente, de forma a estarem sempre ao seu alcance sem precisar de maiores deslocamentos.

No meu caso, os itens essenciais de configuração são:

  • Escrivaninha em L - permite ter um lado dedicado ao computador, e mais um tampo confortavelmente disponível para material de apoio, leitura ou mesmo escrita. E a minha é auto-organizante ;-)
     

  • Arquivo de pastas suspensas - a quantidade de papeis que precisam ser arquivados e mantidos organizados pode variar, mas um arquivo de pastas suspensas é uma solução que serve para grande parte dos casos. Eu dependo do meu arquivo de pastas suspensas para me manter em dia (claro que também dou atenção à organização dos arquivos no computador).
     

  • Gavetas para materiais de apoio - cabos, baterias, folhas em branco, canetas, CDs, periféricos diversos - se tudo o que eu uso no meu dia-a-dia ficar exposto ou não tiver um lugar certo, se transformará em fonte de distração, e também de perda de tempo quando for preciso procurar.
     

  • Multifuncional - o fax já saiu de circulação, mas o scanner, impressora e copiadora da minha multifuncional continuam em uso diário, e resolvem boa parte das minhas necessidades de comunicação que não podem ser completadas on-line.
     

  • Computador com mais de um monitor - para mim trabalhar com múltiplos monitores dá muito certo, mas para você pode ser desnecessário. Eu ganho muita produtividade podendo deixar 2 documentos maximizados simultaneamente - em um monitor, fica o que estou trabalhando, e no outro ficam os que estiverem sendo usados como referência. Recentemente agreguei um terceiro, de 7 polegadas, que permite deixar o comunicador instantâneo (quando ativado, claro) sempre visível, sem precisar alternar com o documento de trabalho, o que só faz sentido para quem usa este recurso como ferramenta de trabalho, claro. No meu caso, sempre que possível substituo telefonemas de trabalho por IMs.
     

  • Telefone exclusivo, com secretária eletrônica e viva-voz - a realidade de um home office é que você terá que atender ligações enquanto olha para a tela do computador, e aí podem faltar mãos - a não ser que você use um headset ou o viva-voz, que é a minha alternativa preferida. A secretária eletrônica, com uma mensagem informando claramente seu horário de atendimento e facilitando a gravação de recados, é a solução para as suas ausências e para ajudar a separar a vida profissional da vida pessoal - quando acaba seu expediente, ela continua a atender e pegar recados, e a linha exclusiva permite que isso não se misture com as comunicações da família.
     

  • Fone de ouvido com redução de ruídos externos - Assim não é necessário fazer ginásticas de concentração enquanto a diarista passa aspirador ou o vizinho pratica violino.
     

  • Estante com materiais de referência - Periódicos, dicionários, livros técnicos, pastas diversas, etc. - ou estão à mão, ou você não os usará sempre que precisar deles, e vai acabar sem saber se o certo é escrever ascensão ou ascenção ;-)

Será que vai dar certo para você?

Espero que sim! Home office é racional, eficiente e até ecológico. Imagine quantos recursos são literalmente queimados todos os dias enquanto trabalhadores cujas atividades poderiam ser desempenhadas remotamente se deslocam para seus escritórios? E quanto eles poderiam produzir a mais se usassem a seu favor esse tempo e os recursos associados?

No meu caso o salto foi mais simples do que a maioria: não precisei deixar a minha atividade externa para adotar o home office, e acumulei os 2 (e continuo me deslocando todos os dias, portanto - mas tento ser produtivo no trânsito, no limite do possível). Mas o ganho de produtividade foi muito grande, e mais do que compensou o investimento, desde o primeiro ano.

E a palavra investimento vem a calhar no contexto: se o seu home office for para realizar uma atividade profissional, é preciso planejá-lo de acordo - afinal, o retorno que ele vai gerar precisa ser superior ao que você vai gastar (em dinheiro, esforço e desgaste) com ele.

Nada de se contentar com um cantinho! É importante pensar grande na hora de planejar o home office, mas pode ser necessário começar pequeno - mesmo que seja no cantinho. Não necessariamente você vai iniciar com a área, a mobília, iluminação, ergonomia, conforto, organização e comunicações que seriam desejáveis. Mas conforme o home office for dando o retorno desejado, reinvista nele uma parte do lucro, até ter as condições de trabalho planejadas.

Portanto, depois das primeiras semanas saboreando o fim dos deslocamentos constantes, da ditadura dos trajes de trabalho e a enorme flexibilidade de horário, vai acabar caindo a ficha de que trabalho é trabalho, e o conforto de fazê-lo a partir de casa é contrabalançado por uma série de novos desafios.

Eu venho vencendo esses desafios há alguns anos, e assim posso testemunhar que é possível. Quando você conseguir, não esqueça de reinvestir parte dos ganhos em melhores condições de trabalho, mas também em qualidade de vida, afinal não vivemos para ser eficientes - a ideia é ser mais eficiente para viver melhor!

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