Peter Drucker, Milton Nascimento e a morte(?) dos comentários em blogs, assassinados pelo Twitter
Você acredita que toda crise é composta por uma ameaça e uma oportunidade? E acha que Milton Nascimento não tem nada com isso?
A morte, ou pelo menos a redução radical, do hábito de manter conversações abertas e amplas em comentários de blogs é uma tendência (ou alegação) cada vez mais frequente, e a última repetição que vi foi em uma palestra de Khris Loux, mantenedor de um sistema de comentários que está presente em 600.000 sites - e se há alguma tendência de aumento ou redução de comentários, alguém assim deveria saber, certo?
"Onde foram parar os comentários?"
Na condição de blogueiro amador e veterano (o BR-Linux está no ar desde 1996...), eu só concordo parcialmente. Tenho visto cada vez menos comentários em uma série de blogs voltados ao público mais tecnológico, mas em outros os comentários continuam presentes e crescentes, inclusive com a manutenção da antiga noção do blog ou site como o ponto focal de uma comunidade que o usa como central de debates sobre as novidades do dia (e os comentários de gente que não está entendendo direito o que está acontecendo mas quer fazer a sua perguntinha sem ler o texto permanecem mais vivos do que nunca, claro...).
Mas o que me chama a atenção é a idéia, que tantas vezes vejo repetida, de que a redução dos comentários é um sinal da decadência do fenômeno dos blogs em si. Pessoalmente, sempre achei que o número de comentários em um blog é uma medida pobre da sua relevância, e tende a confundir controvérsia com popularidade. Como tenho acesso às estatísticas de alguns blogs populares, venho observando que o número de comentários diários em vários deles vem mesmo caindo aos poucos, enquanto o número de leitores e page views diários permanece em suave crescimento. Ou seja: a tal "morte dos comentários" não necessariamente é algo tão ruim
Entra em cena Peter Drucker
Pessoalmente não boto muita fé naquela velha crença de que a palavra crise, em algum idioma oriental, é escrita como a soma dos ideogramas de "ameaça" e "oportunidade" (e não sou o único). Mas não nego que muitas vezes as falhas e crises são acompanhadas por oportunidades importantes.
Em um artigo recente já comentei o quanto já recorri, durante a graduação em Administração, aos escritos de Peter Drucker, que sempre me dava a impressão de ter discorrido sobre praticamente todos os assuntos do universo administrativo, em sua vasta obra. E aparentemente estou voltando ao hábito, pois hoje volto a recorrer aos seus escritos.
Drucker também não aderiu diretamente ao "ditado oriental" acima, mas ele dá uma dica mais objetiva: toda falha imprevista deve motivar a busca de oportunidades de inovação, e esta busca não deve se limitar à usual análise dos dados existentes, e sim à uma coleta de informações adicionais sobre as circunstâncias, ambiente e motivos da falha, e até mesmo sobre como ela afetou a concorrência, parceiros, fornecedores, etc.
Algumas falhas são apenas... falhas
Para ele, muitas falhas se devem a motivos banais, e apontam apenas para a "oportunidade" de corrigir o processo ou sanar a deficiência que deu origem a ela e não deveria estar lá desde o princípio. São essas as falhas causados por erros resultantes da ganância, estupidez, adoção impensada da prática de seguir o que todo o mercado estiver fazendo no momento, ou até mesmo da incompetência no projeto ou execução.
Mas a porca torce o rabo (e aponta uma oportunidade) quando algo que foi genuinamente bem planejado e executado falha mesmo assim. Essas situações, quando acontecem, podem estar apontando mudanças ambientais que trazem consigo a oportunidade de inovar. A causa pode ser uma nova ferramenta, uma nova expectativa dos clientes, uma alteração nas ofertas da concorrência ou, de forma genérica, uma alteração nos valores e percepções do público.
Voltando aos comentários dos blogs
Quando o fenômeno acima acontece, geralmente é percebido pela falha inesperada em algo que funcionava bem, e sua análise leva à conclusão de que as premissas que guiavam o projeto ou a estratégia de mercado para um determinado produto ficaram subitamente ultrapassadas.
E é isso que eu vejo acontecer com os comentários "comunitários" em blogs. Eles não estão extintos, mas boa parte deles agora acontecem fora dos blogs: migraram para as pastagens mais verdes que encontram na liberdade dos microblogs (como o Twitter), no diálogo mais amplo e associativo que acontece nas redes sociais, ou (em casos menos frequentes) para os novos blogs criados por aquelas pessoas que antes tinham o hábito de comentar frequentemente nos blogs alheios.
Ou, voltando a Drucker, neste caso o público continua querendo consumir o mesmo serviço, que é a oportunidade de comentar com outros interessados sobre as notícias do dia, mas agora busca nisso um novo valor, que é o interesse em fazê-lo livre e diretamente junto à comunidade dos seus amigos e colegas, e não à audiência de um determinado blog.
Os comentaristas migraram. Faz diferença pro blogueiro?
Se os comentários que antes aconteciam no seu blog migraram para o Twitter ou para alguma rede social, isso pode não ser o fim do seu modelo de viabilização. Afinal, a não ser que os comentários sejam mais relevantes que o material que você mesmo publica, as pessoas interessadas no assunto continuarão acompanhando seu blog, ou ao menos seguindo os links em profusão nos comentários das mídias sociais e microblogs.
Indo aonde o público está
Mas se a interação com os leitores é um valor importante no seu mix, você terá que seguir o conselho tradicional de Milton Nascimento: o artista tem de ir aonde o povo está. Se o seu público é atuante no Twitter, integre-se a ele lá. Se foram para o Orkut, respire fundo e participe lá também. Considere ferramentas de integração entre o seu conteúdo e estas comunidades, mas siga a regra número 1 do Efetividade.net para quem quer popularidade para seu blog: Não Seja Chato! Se você tentar forçar a barra para forçar todo mundo a ver seu post, com palavras-chave forçadas e inserções artificiais e mal-disfarçadas, você não estará sendo melhor do que tantas agências de publicidade que falham fragorosamente (ou silenciosamente, o que é bem pior para elas) ao tentar oferecer "estratégias de redes sociais" para seus clientes.
Concluindo a discussão: pesquise e mude - ou não
Meu guru Peter Drucker já dizia: ao identificar as causas prováveis de uma falha, aplique-as ao que você fará de agora em diante. Foi o que fez o Khris Loux, que mencionei lá no início do texto: ele notou a redução do uso da ferramenta de comentários que oferece a 600.000 blogs, e agora já está oferecendo outra para agregar aos blogs os comentários realizados no Twitter.
Se você percebeu a mesma situação, que tal ir atrás de alternativas também? Acho pouco provável que os comentários diretos voltem a ser o que eram (quantitativa e genericamente falando), mesmo que os microblogs sejam uma moda passageira - se o caso for este, eles acabarão migrando para a próxima moda.
Ou então prossiga com o que você sempre fez. De modo geral, há permanente escassez de conteúdo original, interessante e relevante na Internet, e se você já estiver com uma boa estratégia de produção desta mercadoria rara, é provável que a situação dos comentários não vá inviabilizá-la, desde que você não dependa deles para medir ou alcançar o seu sucesso.
Efetividade no Twitter
Pessoalmente, ainda não tenho uma tal "estratégia de redes sociais", embora esteja de olho no Twitter (lá sou o @augustocc), principalmente para ir aprendendo o que não fazer ;-)
Dica extra
Se você ficou curioso com as minhas referências ao Peter Drucker, recomendo dar uma olhada em algum de seus livros que continuam circulando. Para o pessoal da web, sugiro especialmente procurar na sua livraria preferida o A Administração na Próxima Sociedade e o Administrando em tempos de grandes mudanças.
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