Como integrar GTD com Gerenciamento de Projetos?

É possível integrar as técnicas da Produtividade Pessoal do GTD às melhores práticas do Gerenciamento de Projetos – veremos hoje como fazer, após refletir sobre o limite até onde isso vale a pena.

O leitor Gustavo M. S. enviou a seguinte questão:

Acompanho seu site Efetividade desde de 2010 e ele vem me ajudando bastante! Tenho que dar o braço a torcer aqui, sou muito agradecido a vc por me mostrar o mundo do GTD. Venho praticando GTD a 2 anos e confesso que ainda estou fazendo ajustes finos no meu sistema. Sou engenheiro de elétrico e atuo como engenheiro de projetos em uma industria de alimentos. Certo dia acompanhando um podcast ouvi que vc é pós-graduado em gerenciamento de projetos. Hoje tenho certa dificuldade em integrar o GTD com as fases do gerenciamento de projetos, assim gostaria da sua opinião sobre isso e como que vc faz esta integração.

Eu já respondi diretamente ao Gustavo, mas quero aproveitar para ampliar um pouco o tema por aqui, começando por esclarecer: o Gerenciamento de Projetos a que o Eng. Gustavo se refere é aquele mesmo sobre o qual o PMI (Project management Institute) lança seus guias de melhores práticas, incluindo o notório (entre os praticantes da área) PMBoK, um guia de conceituação e melhores práticas para gerenciar projetos.

Do ponto de vista do PMBoK, o gerenciamento de projetos é um conjunto de atividades bem definido, composto por 47 processos que se estendem ao longo de 5 fases (iniciação, planejamento, execução, monitoramento/controle e encerramento) abrangendo 10 áreas de conhecimento (escopo, tempo, custo, qualidade, risco, comunicação, etc.).

Projetos no GTD

Acontece que o GTD também tem uma abordagem de projetos, que paira em grau de abstração bem menos definido do que o do PMBoK.

No livro Getting Things Done, que definiu o método, um capítulo inteiro (o 10) é dedicado a "Deixar os projetos sob controle", e ele começa estabelecendo a experiência do autor em relação a identificar que a dificuldade das pessoas com perfil de gerenciamento de projetos (como o Gustavo, que trabalha na área, e eu, que me especializei nela) em trazer sua abordagem para o contexto da produtividade pessoal não diz respeito ao ferramental, mas sim a lidar com o volume de dados produzido por ele.


Na prática, colocar em um gráfico de Gantt como o da imagem acima o plano de trocar de carro no final do ano, considerando prazos, orçamento, custos, quem fará o que, etc., no final das contas acaba sendo a parte fácil – afinal, na produtividade pessoal, geralmente trabalhamos sem equipe, e lidar com a quantidade de variáveis que surge nas fases de execução e acompanhamento é algo que precisa ser feito integralmente por você.

E é isso que faz muitos gráficos de Gantt de planejamento da formatura ou da festa de casamento irem para uma gaveta uma semana depois de serem feitos com todo o capricho, e jamais sair de lá: o que faz falta são as ferramentas para acompanhamento e tomada de decisões durante a execução, em caráter individual, e é isso (em complemento a ferramentas de projetos que você já domine, como os gráficos de Gantt e as declarações de escopo, por exemplo) que o GTD pode agregar.

No capítulo 10 do GTD, David Allen registra que há 2 categorias de projetos pessoais para os quais faz sentido uma abordagem especial (ou seja, diferente das demais ações do dia-a-dia): aqueles aos quais você continua a dar atenção mesmo após ter determinado quais são as próximas ações, e aqueles para os quais ideias potencialmente úteis e detalhes de suporte continuam a surgir.

Para isso, o GTD detalha o uso de uma série de técnicas de planejamento (brainstorming, organização, reuniões, coleta de informações, captura de ideias espontâneas, etc.

Baseado na sua premissa de que boas ferramentas podem não ser suficientes para causar boas ideias, mas frequentemente contribuem para elas, ele também lista um conjunto de instrumentos de escrita, de comunicação, de processamento e de suporte que podem contribuir para o resultado.


Ele destaca como importante manter uma pasta para folhas soltas (e não um caderno, bloco ou outro instrumento sequencial) para reunir as suas informações do projeto, e essa é também a minha abordagem preferida - quem me conhece profissionalmente sabe que eu passo o dia com a prancheta portátil da imagem acima, que usa fichas 3x5 (aquelas de fichamentos colegiais...), e quando chego na minha mesa, após processar, arquivo cada ficha na pasta de seu projeto.

Outra categoria de ferramenta em destaque são os editores de listas, que permitem categorizar, subdividir e refinar cada ideia até o nível que se deseja chegar – mais ou menos como se faz com um diagrama de espinha de peixe ou um mapa mental, também. Ele destaca que várias ferramentas específicas para o planejamento de projetos são rigorosas e detalhadas demais para o tipo de planejamento e execução criativos que ocorrem no nível pessoal, e eu concordo.

Fora isso, os projetos sob o enfoque do GTD são basicamente uma versão especializada das listas de próximas ações, baseando-se sempre na ideia de estar confortavel em ter, registrar e usar suas ideias e informações, habituando-se a usar construtivamente os recursos para atuar sobre resultados desejados e as pendências no caminho deles, antes de ser obrigado a fazê-lo.

Em conclusão

Dito tudo isso, vamos ao que eu respondi ao Eng. Gustavo:

Oi! Eu tomo cuidado para não misturar as coisas, senão fecha um curto e o disjuntor desarma ツ

O GTD é para a produtividade pessoal, e tem até mesmo seu enfoque próprio para projetos pessoais (com escopo bem restrito, basicamente registro e acompanhamento).


Já o Gerenciamento de Projetos como nós conhecemos (PMBoK, etc.) é para projetos que vão desde uma churrascada até a invasão de um país inimigo, e excede em muito o escopo da produtividade pessoal (ou da mera produtividade, genericamente falando).

Eu procuro não combiná-los mais do que o inevitável - se estou aplicando GP, uso as melhores práticas de GP, e se estou usando métodos de produtividade pessoal, não tento aplicar a eles os conceitos de GP. É o que te recomendo, também: alguma sobreposição é natural, mas uma teoria unificada que una produtividade pessoal e gerenciamento de projetos e chegue até ao nível operacional não me parece desejável.

E é isso: cada um na sua, aproveitando um pouco do melhor de cada um no campo do outro, mas sem exagerar na mistura, porque de modo geral eles podem funcionar melhor lado a lado do que sobrepostos.

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